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quarta-feira, 29 de agosto de 2012

No início, são alguns goles de bebida alcoólica e um ou outro cigarro. Depois, desponta uma curiosidade por maconha e até pode chegar ao uso de cocaína e crack. Esse costuma ser o trajeto de adolescentes pelo mundo das drogas, que tem começado cada vez mais cedo. Um levantamento realizado pelo Portal Educacional mostrou que aos 15 anos de idade, 75% dos jovens já beberam pelo menos uma vez na vida e 31% já beberam além da conta. Os resultados são da pesquisa chamada "Este Jovem Brasileiro - Álcool", que contou com 11.846 jovens de 13 a 17 anos de todo o país. Além disso, 30% dos jovens começaram a beber com regularidade a partir de 14 ou 15 anos. 
Dr. Arthur Guerra é psiquiatra e realiza vários trabalhos sobre álcool e drogas
O papel dos pais na tentativa de evitar que o filho entre nesse caminho ou de ajudá-lo a sair pode fazer toda a diferença. Por isso, entrevistamos o psiquiatra Arthur Guerra, especialista do Minha Vida e Coordenador do GREA, Programa do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, para esclarecer dúvidas sobre a atitude da família com o adolescente quando o assunto é drogas. Confira: 

Por que o uso de drogas pode ser mais comum na adolescência?

O adolescente está em uma fase muito especial da vida: está deixando de ser criança para virar adulto, uma fase de mudanças e novas experiências. A curiosidade é um dos maiores motivos que o leva a experimentar alguma droga e, depois de um tempo, passar a experimentar outras cada vez mais pesadas. De cada 10 adolescentes que experimentam drogas, um acaba virando dependente.  

Como os pais podem interferir na vida do filho adolescente na tentativa de que ele fique longe das drogas?

Sem dúvida, a principal forma de prevenção é os pais darem o exemplo sadio. Acho errado pais que deixam o filho experimentar e consumir bebida alcoólica, cigarro ou outras drogas dentro de casa, junto com eles. O certo é mostrar que o consumo dessas drogas é prejudicial à saúde e não manter esse hábito.  
"De cada 10 adolescentes que experimentam drogas, um acaba virando dependente."

Nem mesmo o álcool pode ser permitido entre os adolescentes?

Exatamente. O consumo de alcool é sempre um hábito negativo, por três motivos principais: primeiro porque o adolescente não consegue ter controle sobre o uso e acaba consumindo de forma exagerada, vai pela empolgação e pelos amigos. Segundo, o cérebro do jovem onde o álcool vai agir ainda não está totalmente amadurecido, o que pode prejudicar o rendimento escolar dele. O terceiro, por fim, é o risco maior de dependência: quanto mais cedo a pessoa começar a usar, maiores serão as chances de ter problemas de saúde e de acostumar o corpo ao uso frequente de álcool. 

Quais sinais podem levar os pais a desconfiar que o filho seja usuário de drogas?

Quando o pai começa a desconfiar de mudanças de comportamento. Essa mudança é percebida principalmente aos observar os amigos do filho - ou ele muda as amizades, ou os amigos também começam a ficar com comportamentos diferentes. O adolescente ainda pode ter uma piora do rendimento escolar na escola, ficar irritável, trocar o dia pela noite e conversar menos dentro de casa.

O que precisa ser feito quando a família constata que existe uma situação de uso de drogas?

O primeiro passo é observar o comportamento e procurar conversar com o filho. É muito importante entender qual é o tipo de droga usado e a frequência, além de procurar ajuda profissional.  
Apoio da família é fundamental para o tratamento da dependência

Como identificar que o filho está dependente?

Se ele fizer um uso eventual de maconha e álcool, por exemplo, não terá o comportamento tão afetado no dia a dia. Pode ser um consumo ligado a uma situação de festa e eventos esporádicos, mas que mesmo assim é perigoso e precisa de atenção. Já quando o adolescente está dependente, ele precisa usar a droga sempre para não ter abstinência. Se os pais observarem o comportamento e a rotina do filho e mantiverem sempre um diálogo, conseguirão perceber com facilidade essas diferenças. 

O tratamento do adolescente é diferente do tratamento adulto?

Sim. O tratamento em todas as faixas etárias costuma ser multifacetado, ou seja, com várias áreas envolvidas (psiquiatra, psicólogo e outros). O adolescente, porém, precisa ainda mais do ambiente familiar e de um grande suporte dos amigos. É difícil você chegar a esse jovem e simplesmente dizer "você nunca mais vai usar álcool na sua vida". Ele precisa de apoio para entender o motivo dessa proibição, pois está em uma fase cheia de mudanças e dúvidas. Muitas vezes, o jovem está na busca até de respostas para o seu vício e encontra conforto em grupos de apoio.  

Quando é necessário internação, o jovem deve ir por livre e espontânea vontade ou pode ser forçado a isso?

Em casos em que o jovem não consegue separar as coisas, está em um grau de dependência que perdeu a liberdade de escolher, pode ser até utilizada uma interação involuntária. Mas ela é ruim porque afasta o familiar e o médico do paciente, o que pode aumentar o risco de suicídio. Por isso, o melhor é contar com ajuda médica para tomar qualquer atitude. 
"Quanto mais cedo a pessoa começar a usar drogas, maiores serão as chances de ter problemas de saúde."

A internação é garantia de sucesso da reabilitação?

Não. Ela é uma forma de tratamento que o médico especializado pode indicar, mas não garante que o paciente nunca mais tenha recaídas. As chances de sucesso são bem maiores quando a internação é bem aceita pela pessoa que usa drogas. Por isso, a família e o médico têm de apoiar e incentivar o paciente, mostrando a importância do tratamento. 

Qual deve ser a postura dos pais e da família durante o tratamento?

A família deve sempre buscar orientação e seguir todas as condutas que a equipe de saúde recomenda. Por exemplo: se a equipe fala "não pode usar drogas", a família não pode permitir uma única vez sequer que o filho use drogas. É difícil, porque muitos pais ficam com dó de ver o filho sofrendo com a abstinência e permitem, achando que usar apenas uma vez não terá problemas. Se a equipe também orienta que o adolescente volte aos estudos, a família precisa incentivar isso. É uma medida para que ele volte à vida normal e se distraia. Há pais que deixam o filho ficar em casa, com medo de que ele se irrite demais ao forçá-lo a ir à escola. 
É fundamental, portanto, tanto dar apoio e carinho quanto ser mais rígido em alguns momentos. Quando o tratamento é mais difícil por conta do comportamento e da dependência do adolescente, os pais podem atrapalhar se forem flexíveis demais com o filho. 

Como as drogas ilícitas mais comuns agem no organismo do adolescente?

Maconha causa taquicardia, dilatação das veias oculares, euforia seguida por um momento de sonolência ou depressão, boca seca, ansiedade, pânico, alucinações, diminuição da atenção, dificuldade de coordenação motora, entre outros. Em longo prazo, pode causar dependência - irritabilidade, insônia e ansiedade ao não fumar -, prejuízo da memória (déficit de atenção), tristeza, câncer no trato respiratório, câncer de cabeça e pescoço, bronquite, enfisema e tosse crônica. 
Cocaína e crack causam euforia, diminuição de apetite e sono, taquicardia, aumento da pressão arterial, irritabilidade, paranoia, entre outros. Em longo prazo, a droga provoca alterações de humor, psicose, ataques cardíacos, dores no peito, tontura, convulsões, AVC, perda do olfato, náuseas, dor abdominal, alergias, perda de peso e outros problemas. 
Ecstasy causa agitação, náusea, sudorese, batimento dos dentes, visão borrada, câibras, desidratação, infarto, insuficiência renal. Após o uso da droga, há um prejuízo nas funções mentais, principalmente na memória, que pode durar até uma semana. A intoxicação por esse tipo pode causar aumento da pressão arterial, ataques de pânico, perda da consciência e convulsões. Já o LSD causa taquicardia, aumento da pressão arterial, tontura, perda de apetite, boca seca, náusea e tremores.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Aposte na simplicidade para ser feliz

 

Felizmente existe a ideia da simplicidade, e esta é, digamos, simples desde sua origem. A palavra é formada por duas outras de origem latina: sin, que significa único, um só, e plex, que quer dizer dobra. Ser simples significa ter uma só dobra, ao contrário do complexo, que tem várias. Simples!
Simplificar significa evitar a complexidade e criar uma vida sem mistérios? Há uma diferença fundamental entre ser simples e ser simplório. Os simples resolvem a complexidade, os simplórios a evitam. Eu conheço pessoas sofisticadas, intelectualizadas, que levam uma vida plena, realizam trabalhos difíceis, apreciam leituras profundas e têm hábitos peculiares. E continuam sendo pessoas descomplicadas. Conheço também pessoas simplórias, com pouca profundidade, que realizam trabalhos repetitivos, que têm poucas ambições, que apreciam rotinas e evitam os sustos de uma vida aventurosa. E mesmo assim são pessoas complicadas, para elas tudo é muito difícil, em geral impossível.

Não há um paradoxo em construir uma vida simples em meio à vida moderna, cada vez mais exigente? Hiroshi criou a Ecovila Clareando, uma comunidade autossustentável no interior de São Paulo que atrai gente comprometida com a natureza e com seus valores, como a sustentabilidade, sem a ingenuidade das "sociedades alternativas" de antigamente, mas tendo a simplicidade como filosofia. Ele planta e produz praticamente tudo o que precisa para se alimentar, domina as técnicas de construção ecológica e de produção de energia limpa. Mas não é um isolado, viaja, participa de congressos, dá palestras, toca violão, compõe músicas. E é alegre em tempo integral.

Goldberg é professor da New York University, onde faz pesquisas sobre o cérebro humano, e consegue falar sobre seu funcionamento de maneira compreensível. Escreveu alguns livros, entre eles O Paradoxo da Sabedoria, em que afirma que, apesar do envelhecimento do cérebro, a mente pode manter-se jovem. Seus textos são o melhor exemplo de como se pode simplificar o complexo, pois são sobre neurofisiologia, mas qualquer um entende.

Eu não poderia imaginar vidas mais diferentes e, ao mesmo tempo, mais parecidas. Ambos carregam uma leveza própria das pessoas que decidiram não complicar, sem abrir mão de seus desejos, projetos, pequenos luxos, enfim, da vida normal. Pessoas assim, que fazem a opção da simplicidade, têm alguns traços comuns. Identifico cinco deles:

1. São desapegadas: não acumulam coisas, fazem uso racional de suas posses, doam o que não vão usar mais.

2. São assertivas: vão direto ao ponto com naturalidade, mesmo que seja para dizer não, sem medo de decepcionar, não "enrolam" nem sofisticam o vocabulário desnecessariamente.

3. Enxergam beleza em tudo: em uma flor no campo e em um quadro de Renoir; em uma modinha de viola e em uma sinfonia de Mahler; em um pastel de feira e na alta gastronomia.

4. Têm bom humor: são capazes de rir de si mesmas e, mesmo diante das dificuldades, fazem comentários engraçados, reduzindo os problemas à dimensão do trivial.

5. São honestas: consideram a verdade acima de tudo, pois ela é sempre simples e, ainda que possa ser dura, é a maneira mais segura de se relacionar com o mundo.

Ser simples, definitivamente, não é abrir mão de nada. É possível apreciar o conforto, a sofisticação intelectual, as artes, o prazer da culinária, a aventura das viagens e continuar sendo simples.

Pois ser simples não é contentar-se apenas com o mínimo para manter-se fisicamente vivo, uma vez que não somos só corpo, também somos imaginação, intelecto, sensibilidade e alma. E esta última é, sim, simples, mas não é pequena, a não ser, é claro, que a pessoa queira.